Banco Central falhou: crime organizado ocupou o espaço deixado pela omissão

O anúncio de novas regras para instituições de pagamento e fintechs não deve ser celebrado como um avanço do Banco Central (BC), mas entendido pelo que realmente é: uma tentativa tardia de reparar anos de omissão. Enquanto o órgão regulador se acomodava, o crime organizado transformava brechas legais em corredores abertos para lavar bilhões de reais, dentro e fora do país.

As operações da Polícia Federal mostraram a extensão do problema: mais de R$ 50 bilhões em transações suspeitas, um sistema bancário paralelo com ramificações em pelo menos 15 países e a utilização de fintechs como peça-chave da engrenagem criminosa. Nada disso teria acontecido em tal escala se o BC tivesse cumprido seu papel de fiscalizar de forma rígida desde o início.

Permitir que instituições de pagamento operassem provisoriamente por até 2029, sem autorização plena, foi um erro grotesco — um convite explícito para abusos. A pressa em endurecer agora, após os escândalos, só escancara a negligência: o Banco Central agiu apenas quando a crise se tornou incontornável e a exposição pública inevitável.

A limitação de transferências via Pix e TED, a exclusão das cooperativas e a exigência de capital mínimo de R$ 15 milhões para prestadores de tecnologia são medidas corretas, mas não passam de remendos. São reações a um sistema já contaminado, e não fruto de uma estratégia consistente de prevenção. Enquanto isso, criminosos lucraram, recursos ilícitos circularam e a credibilidade do sistema financeiro brasileiro foi abalada.

O presidente do BC, Gabriel Galípolo, prefere afirmar que não se deve “demonizar” as fintechs. O problema não está nelas, de fato, mas na complacência do regulador. Ao se eximir de responsabilidade, o Banco Central falha duplamente: primeiro, por ter permitido que o crime organizado usasse as lacunas regulatórias; depois, por tentar se colocar como protagonista de uma correção que só veio após pressão policial e escândalos revelados.

O Brasil não precisa de discursos amenos nem de remendos apressados. Precisa de um Banco Central que assuma sua falha histórica, que se comprometa com fiscalização real e permanente e que trate a segurança do sistema financeiro com a mesma urgência que o crime organizado sempre demonstrou ao explorá-lo.

O que está em jogo não é apenas a regulação de fintechs: é a confiança no próprio sistema financeiro nacional. E essa confiança, perdida pela omissão, não será recuperada com medidas tardias e discursos conciliatórios.